sábado, 15 de janeiro de 2011

Mundo Corporativo: Metas ou Pessoas?

Essa semana estive em um banco para pagar uma conta. Ao terminar de efetuar o meu pagamento o rapaz do caixa me ofereceu um serviço do tipo seguro hospitalar. Muito superficialmente ele me apresentou o funcionamento do serviço, o valor e os benefícios. Solicitei para ele o folder, a fim de que pudesse olhar com calma em minha casa. Foi quando ele me disse que precisava muito bater as metas e tinha pressa quanto a minha adesão ao plano. Pensei comigo: acabou de me perder como cliente. Senti que o rapaz estava muito mais preocupado em bater suas tais metas, pois o banco assim exigia dele, do que me oferecer um serviço que de fato atendesse as minhas necessidades. Ele simplesmente não tinha tempo para gastar comigo enquanto cliente.

Esse acontecimento corriqueiro me fez pensar em como o mundo corporativo vem procedendo. As metas tornam-se tão imperativas que já não se presta atenção no cliente e nas suas reais necessidades.

Um grupo de escoteiros teve como meta chegar ao cume de uma montanha. Alguns com muita pressa empurravam os outros que vagarosamente subiam e paravam vez por outra para observar as coisas ao redor do caminho. Havendo o grupo todo chegado em cima do monte, o chefe faz perguntas a respeito do que puderam observar durante o caminho e como aquela experiência com a natureza lhes afetara. Obviamente aqueles que prestaram mais atenção na natureza durante o caminho, foram mais capazes de responder e assim compartliharam as maravilhosas impressões e sensações com o contato que tiveram com as plantas, as sombras das árvores, o cantar dos pássaros com seus ninhos engenhosos, e com toda a natureza em volta daquele percurso que puderam apreciar. O chefe então relata que os que ganhariam as medalhas seriam estes e não aqueles que chegaram primeiro, pois o objetivo não era chegar primeiro e sim ter experiências durante o caminho.

Que tal se o mundo corporativo mudasse a sua lógica de atingimento de metas, por uma em que as necessidades humanas dos clientes, que são seres humanos, fossem atendidas? Que tal se pudessem ensinar isso aos seus colaboradores, ao invés de pressioná-los? Que tal se pudessem abandonar, quando se tratar de ser humano, da lógica fria da economia e da matemática financeira? Será que todos não seriam enriquecidos com os relacionamentos que seriam feitos com os clientes? Qual pessoa não desejaria ser ouvida de fato sobre as suas reias necessidades? Não se poderia dessa forma oferecer um serviço muito mais interessante ao cliente, que de fato o atendesse?

Um dos grandes problemas do mundo corporativo tem sido a perda da visão da dimensão humana, seja ela de seus colaboradores ou de seus clientes, em favor de uma busca desenfreada por lucro e crescimento. Quando isso ocorre, quantos de fato estão ganhando? Quantos de fato na sociedade são beneficiados? E ainda, o quanto de fato o empresário está cuidando da continuidade da vida de seus negócios. Criar um ambiente e uma filosofia de gestão humanizadora no mundo corporativo é o grande desafio de hoje. Do contrário, até onde perdurarão de fato as empresas, quando os clientes começarem a perceber que tudo o que a empresa quer é bater metas e não prestar serviços que de fato atendam as suas reais necessidades? Quando falamos de espiritualidade no ambiente de trabalho, falamos disso: de um modelo de gestão e relacionamentos corporativos capazes de enxergar clientes, parceiros, colegas, fornecedores como os verdadeiros seres humanos que são em toda a sua integralidade.

Empresas que se preocupam com sua imagem na sociedade já estão avançando nesta direção. Muitos clientes, por exemplo já verificam antes de comprar algum produto se a dona daquela marca tem políticas de sustentabilidade, projetos sociais, etc.

Quando estiverem com um cliente na sua frente não o olharão apenas como aquele que o ajudará a bater metas, mas como alguém que de fato é seu próximo e tem necessidades. Ambos serão beneficiados: cliente e empresa. Todavia será necessário parar, prestar atenção, gastar tempo com ele, enriquecer-se da beleza e dos conhecimentos que todo bom relacionamento traz. Que empresas hoje estão dispostas a começar a mudar essa lógica dentro de seus ambientes e de sua gestão?

André Luiz Alves da Silva - Palestrante da Associação Ruah
Desenvolvimento Integral do Ser Humano

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Espiritualidade na Pós Modernidade

Vivemos na chamada era pós-moderna. Esse é o tempo que caracteriza-se pela pluralidade e a conseqüente relativização. Diferenciamos do modernismo onde a crença era a de que a verdade poderia ser encontrada unicamente através da ciência. Porém nesse novo tempo o que se propõe é que não existe uma só verdade, mas sim várias maneiras de interpretar o mundo em que vivemos. O pós-modernismo não precisa ser encarado como um mero ceticismo a respeito de tudo, mas pode ser visto positivamente como a maneira de entender as outras maneiras de ver o mundo. O que já não cabe mais nessa era são os ortodoxismos e dogmatismos engessados das velhas instituições religiosas, científicas, filosóficas, políticas, etc. Entretanto, isso não quer dizer que a ortodoxia precise ser jogada fora, mas pode ser humildemente encarada como mais uma das muitas possíveis interpretações de um mundo e humanidade tão complexos. A tradição terá sua validade sempre que estiver em constante diálogo com outras tradições e aberta a reconstrução e re-significação.
É pensando nisso, que eu tenho chegado a conclusão que uma concepção de espiritualidade precisa estar em conexão com esse novo tempo da humanidade. Este, também chamado de “era da informação”, não é mais o tempo de conhecimentos e pessoas isoladas. Quer queiramos ou não, não estamos sozinhos, além de toda a tecnologia que nos conecta ao mundo inteiro, temos em nossas mãos todo legado de conhecimento como a história, a filosofia, a ciência, a sociologia, a religião, etc. que não nos deixa margem para pensarmos isoladamente. Mas com todo esse acúmulo de saber herdado somada a inescapável conexão com o mundo, com os outros povos, com o diferente; ficamos obrigados a reformular toda nossa vivência a partir dessa perspectiva globalizada e interdisciplinar. Isto não quer dizer que temos que nos tornar em seres despersonalizados, padronizados sem nenhuma identidade própria que nos diferencie. Apesar de tudo isso nos levar a considerar nossas igualdades e diminuir o conflito das nossas diferenças, entendo que podemos e devemos sim manter nossas singularidades, entretanto o que já não é mais possível é termos atitudes de intolerância para com as singularidades dos demais. Neste caso, o diálogo deverá ser o mecanismo mediador que protege a identidade, mas que ao mesmo tempo nos tornará capazes de rever nossas certezas absolutas.
Uma espiritualidade que considera essas premissas fundamentais, forjará seres humanos habilitados a agir amorosamente com o seu próximo, seja ele diferente ou semelhante.  Cultivar espiritualidade na pós-modernidade é se relacionar com os aspectos imateriais que dão significados de existência ao ser humano dentro de sua própria identidade ou tradição ou a partir dela, mas sempre aberto a dialogar com o diferente. A vantagem em relação ao modernismo, é que agora não somos mais os donos da verdade, mas reconhecemos que nossa verdade é uma das muitas verdades possíveis.
Até agora eu me utilizei de termos gerais para tratar do tema de espiritualidade na pós-modernidade, sem entrar em situações específicas. Eu diria que o uso da abstração é proposital para permitir que o leitor possa ele mesmo fazer a aplicação que lhe convier. Mas o que proponho no presente artigo é uma maneira de lidar com nossos significados sejam eles mediados pela religião, pela mística ou pela nossa maneira de lidar e enxergar a vida e tudo o que fazemos e somos. É preciso que, seja lá qual for a nossa (des)crença espiritual, pensemos como habitantes do mesmo planeta, membros da mesma comunidade. O individualismo e materialismo, que imperam também nessa era, nos encaminharão para nossa auto-aniquilação. É preciso mudar, ou os seres humanos vão entrar em extinção. Exemplos disso estamos vendo diariamente nos jornais: guerra, fome, destruição do meio ambiente, aquecimento global, morte de inocentes. A vida humana tornou-se sem valor para os próprios seres humanos, porque matamos uns aos outros.  Os fundamentalismos não nos ajudarão, só acelerarão esse nosso processo suicida. A utopia de um projeto de espiritualidade é fazer com que todos os homens sejam capazes de amar uns aos outros, de dar a vida uns pelos outros, sem matar e sem morrer. Paradoxal? Talvez. Mas é nossa única chance de sobreviver.